Era Vargas


A chamada "Era Vargas" começa com a Revolução de 30 e termina com a deposição de Getúlio Vargas em 1945. É marcada pelo aumento gradual da intervenção do Estado na economia e na organização da sociedade e também pelo crescente autoritarismo e centralização do poder. Divide-se em três fases distintas: governo provisório, governo constitucional e Estado Novo.

Governo Provisório

Getúlio Vargas é conduzido ao poder em 3 de novembro de 1930 pela Junta Militar que depôs o presidente Washington Luís. Governa como chefe revolucionário até julho de 1934, quando é eleito presidente pela Assembléia Constituinte. O governo provisório é marcado por conflitos entre os grupos oligárquicos e os chamados tenentes que apóiam a Revolução de 30. Getúlio Vargas equilibra as duas forças: atende a algumas reivindicações das oligarquias regionais e nomeia representantes dos tenentes para as interventorias estaduais. O interventor em São Paulo é um veterano do movimento tenentista, João Alberto. Para o Rio Grande do Sul, nomeia Flores da Cunha e para os Estados do Norte-Nordeste e Espírito Santo é escolhido um supervisor, Juarez Távora, que fica conhecido como "vice-rei do Norte".
Agitações sociais – Em 1931 o PCB organiza no Rio de Janeiro uma manifestação contra a carestia, a Marcha contra a Fome, violentamente reprimida. Em vários Estados também pipocam greves e manifestações de oposição. Os setores oligárquicos afastados do poder se reorganizam, exigem a convocação de uma Assembléia Constituinte e o fim do governo provisório. São Paulo, principal centro econômico do país, lidera a oposição a Vargas.

Revolução Constitucionalista


Em 1932 as elites paulistas deflagram a Revolução Constitucionalista contra o governo federal. Uma frente entre o Partido Republicano Paulista, derrotado pela Revolução de 30, e o Partido Democrático lança a campanha pela imediata convocação de uma Assembléia Constituinte e o fim das intervenções nos Estados. O movimento tem o apoio das classes médias. Manifestações e comícios multiplicam-se na capital. Em um deles, dia 23 de maio de 1932, os manifestantes entram em conflito com o chefe de polícia Miguel Costa e quatro estudantes são mortos: Euclides Bueno Miragaia, Mário Martins de Almeida, Dráusio Marcondes de Souza e Antônio Américo Camargo de Andrade. Com as iniciais de seus nomes é composta a sigla MMDC (Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo), assumida como emblema do movimento rebelde. Em 9 de julho de 1932 estoura a rebelião armada. As forças paulistas comandadas pelo general Isidoro Dias Lopes ficam isoladas: não recebem ajuda dos outros Estados e a Marinha bloqueia o porto de Santos impedindo-as de comprar armas no exterior. Os paulistas se rendem em 3 de outubro, depois de quase três meses de luta.

Constituição de 1934 – As eleições são realizadas dia 3 de maio de 1933 e a Assembléia Constituinte é instalada em 15 de novembro. Pela primeira vez uma mulher é eleita deputada no país, a médica Carlota Pereira de Queiroz. Promulgada em 15 de julho de 1934, a Constituição mantém a república federativa, o presidencialismo, o regime representativo e institui o voto secreto. Amplia os poderes do Estado, que passa a ter autonomia para estabelecer monopólios e promover estatizações. Limita a atuação política do Senado, incumbindo-o da coordenação interna dos três poderes federais. Institui o Conselho de Segurança Nacional e prevê a criação das justiças Eleitoral e do Trabalho. Nas disposições transitórias, transforma a Assembléia Constituinte em Congresso e determina que o próximo presidente seja eleito indiretamente por um período de 4 anos.

Governo Constitucional

Getúlio Vargas é eleito presidente pelo Congresso em julho de 1934 e exerce o mandato constitucional até o golpe do Estado Novo, em 10 de novembro de 1937. Os três anos de legalidade são marcados por intensa agitação política, greves e o aprofundamento da crise econômica. Nesse quadro, ganham importância movimentos como a Ação Integralista Brasileira (AIB) e a Aliança Nacional Libertadora (ANL).
Ação Integralista Brasileira – As idéias fascistas chegam ao Brasil nos anos 20, propagam-se a partir do sul do país e dão origem a pequenos núcleos de militantes. Em 1928 é fundado o Partido Fascista Brasileiro. A organização mais representativa dos fascistas, porém, é a Ação Integralista Brasileira (AIB), fundada em 1932 pelo escritores Plínio Salgado e Gustavo Barroso. O movimento é apoiado por setores direitistas das classes médias, dos latifundiários e dos industriais. Recebe a adesão de representantes do clero católico, da polícia e das Forças Armadas. Defende um Estado autoritário e nacionalista que promova a "regeneração nacional", com base no lema "Deus, Pátria e Família".

Plínio Salgado (1895-1975) nasce em São Bento do Sapucaí, São Paulo, e estuda ciências humanas em Minas Gerais. Desde jovem dedica-se ao jornalismo. Elege-se deputado estadual em 1928 e, em 1932, funda a Ação Integralista Brasileira (AIB). Em menos de quatro anos, o movimento reúne mais de 300 mil adeptos em todo o país. De inspiração nazi-fascista, adota uma simbologia nacionalista, uma camisa verde como uniforme e, como saudação, a palavra anauê, uma interjeição da língua tupi. Apontado como líder do levante integralista de 1938, Plínio Salgado é preso na fortaleza de Santa Cruz, e depois exilado em Portugal. Volta ao Brasil em 1945, com o fim do Estado Novo, e funda o Partido da Representação Popular (PRP). Em 1955, concorre à Presidência da República e chega em último lugar. Elege-se deputado federal em 1958 e 1962 pelo PRP, e em 1966 e 1970 pela Arena. Membro da Academia Paulista de Letras, escreve romances, ensaios e obras políticas.

Aliança Nacional Libertadora – O agravamento das condições de vida das massas urbanas e rurais, e as tendências autoritárias de Vargas fornecem os ingredientes para formar a Aliança Nacional Libertadora (ANL), em março de 1935. A ANL é uma grande frente política formada por ex-tenentes, comunistas, socialistas, líderes sindicais e liberais alijados do poder. O capitão da Marinha Hercolino Cascardo, líder da revolta do couraçado São Paulo na Revolução Paulista de 1924, é escolhido para dirigi-la. Luís Carlos Prestes, ex-chefe da Coluna Prestes e já militante do Partido Comunista, é indicado seu presidente de honra. A ANL defende a suspensão definitiva do pagamento da dívida externa, ampliação das liberdades civis, proteção aos pequenos e médios proprietários de terra, reforma agrária nos latifúndios improdutivos, nacionalização das empresas estrangeiras e instauração de um governo popular.
Movimento nacional – Formada à semelhança das frentes populares antifascistas e antiimperialistas da Europa, a ANL é o primeiro movimento de massas de caráter nacional. Em apenas 3 meses forma 1.600 núcleos, principalmente nas grandes cidades. Só no Rio de Janeiro inscrevem-se mais de 50 mil pessoas. Congrega operários, estudantes, militares de baixa patente e membros da classe média. Seu rápido crescimento assusta as classes dominantes. Surgem campanhas contra a "ameaça comunista". Getúlio Vargas começa a reprimir os militantes e, em 11 de julho de 1935, decreta a ilegalidade da ANL e manda fechar suas sedes.

Intentona Comunista

Após o fechamento da ANL, o Partido Comunista começa a preparar uma insurreição armada. Em 23 de novembro de 1935 estoura em Natal um levante de militares ligados ao partido. No dia seguinte, o mesmo ocorre no Recife e, no dia 27, no Rio de Janeiro. A rebelião fica restrita aos muros dos quartéis, mas serve de argumento para o Congresso decretar estado de sítio. A polícia, dirigida por Filinto Müller, desencadeia violenta repressão aos comunistas.

Golpe de Estado

O estado de sítio aumenta o poder de Vargas e de alguns altos oficiais do Exército e da própria polícia. Crescem a repressão aos movimentos sociais e a conspiração para instaurar uma ditadura no país. É nesse clima que se inicia a campanha para as eleições presidenciais, previstas para janeiro de 1938.
Campanha eleitoral – Três candidatos são lançados à Presidência. O paulista Armando de Sales Oliveira é apoiado pelos partidos Constitucionalista (sucessor do Partido Democrático) e Republicano Mineiro, pelo governador gaúcho, José Antônio Flores da Cunha, e por facções liberais de outros Estados. O paraibano José Américo de Almeida é apoiado pelo Partido Libertador do Rio Grande do Sul, pelo governo de Minas e pela maioria das oligarquias nordestinas. O terceiro candidato é o integralista Plínio Salgado. Vargas declara seu apoio a José Américo, mas, ao mesmo tempo, encomenda secretamente ao jurista Francisco Campos, simpatizante do fascismo e futuro Ministro da Justiça, uma nova Constituição para o Estado autoritário que pretende estabelecer.
Plano Cohen – Em 30 de setembro de 1937 o general Góis Monteiro, chefe do Estado-maior do Exército, divulga à nação o "tenebroso" Plano Cohen: uma suposta manobra comunista para a tomada do poder através da luta armada, assassinatos e invasão de lares. O Plano não passa de uma fraude forjada por membros da Ação Integralista para justificar o golpe de estado. Frente à "ameaça vermelha", o governo pede ao Congresso a decretação de estado de guerra, concedido em 1º de outubro de 1937. É o início do golpe.
O golpe – Com o golpe já em andamento, Getúlio reforça suas alianças com o governador de Minas, Benedito Valadares, e de vários Estados do Nordeste. Em 10 de novembro de 1937 as Forças Armadas cercam o Congresso Nacional e, à noite, Vargas anuncia em cadeia de rádio a outorga da nova Constituição da República, elaborada pelo jurista Francisco Campos. A quarta Constituição do país e terceira da República, conhecida como "a polaca" por inspirar-se na Constituição fascista da Polônia, institui a ditadura do Estado Novo.
Constituição de 1937 – A Constituição outorgada acaba com o princípio de harmonia e independência entre os três poderes. O Executivo é considerado "órgão supremo do Estado" e o presidente é a "autoridade suprema" do país: controla todos os poderes, os Estados da Federação e nomeia interventores para governá-los. Os partidos políticos são extintos e instala-se o regime corporativista, sob autoridade direta do presidente. A "polaca" institui a pena de morte e o estado de emergência, que permite ao presidente suspender as imunidades parlamentares, invadir domicílios, prender e exilar opositores.

Estado Novo

A ditadura Vargas, ou Estado Novo, dura oito anos. Começa com o golpe de 10 de novembro de 1937 e se estende até 29 de outubro de 1945, quando Getúlio é deposto pelos militares. O poder é centralizado no Executivo e cresce a ação intervencionista do Estado. As Forças Armadas passam a controlar as forças públicas estaduais, apoiadas pela polícia política de Filinto Müller. Prisões arbitrárias, tortura e assassinato de presos políticos e deportação de estrangeiros são constantes. Em 27 de dezembro de 1939 é criado o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), responsável pela censura aos meios de comunicação, pela propaganda do governo e pela produção do programa Hora do Brasil.
As bases do regime – O Estado Novo é apoiado pelas classes médias e por amplos setores das burguesias agrária e industrial. Rapidamente Vargas amplia suas bases populares recorrendo à repressão e cooptação dos trabalhadores urbanos: intervém nos sindicatos, sistematiza e amplia a legislação trabalhista. Sua principal sustentação, porém, são as Forças Armadas. Durante o Estado Novo elas são reaparelhadas com modernos armamentos comprados no Exterior e começam a intervir em setores considerados fundamentais para a segurança nacional, como a siderurgia e o petróleo. A burocracia estatal é outro ponto de apoio: cresce rapidamente a abre empregos para a classe média. Em 1938, Vargas cria o Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp), encarregado de unificar e racionalizar o aparelho burocrático e organizar concursos para recrutar novos funcionários.
Propaganda – No início dos anos 40 o Estado Novo alcança certa estabilidade. Os inimigos políticos já estão calados e as ações conciliatórias com os diversos setores da burguesia evitam oposições. Na época, o jornal O Estado de S. Paulo, sob controle direto do DIP, não cansa de publicar editoriais exaltando o espírito conciliador do ditador. Um deles, por exemplo, diz que Vargas é um "homem sem ódio e sem vaidade, dominado pela preocupação de fazer o bem e servido por um espírito de tolerância exemplar, sistematicamente devotado ao serviço da Pátria". Inúmeros folhetos de propaganda enaltecendo o caráter conciliador de Vargas e sua faceta de "pai dos pobres" são produzidos pelo DIP e distribuídos nos sindicatos, escolas e clubes.

Revolta integralista

Os integralistas apóiam o golpe de estado desde a primeira hora mas não conseguem participar do governo. Sentem-se logrados quando Vargas extingue a Ação Integralista Brasileira junto com os demais partidos. Formam então a Associação Brasileira de Cultura e passam a conspirar contra o ditador. Tentam um primeiro golpe em março de 1938, mas são prontamente reprimidos. Dois meses depois organizam a invasão do Palácio Guanabara, no Rio de Janeiro, com o objetivo de assassinar Vargas. A guarda do Palácio resiste ao ataque até chegarem tropas do Exército. Vários integralistas são presos e alguns executados no próprio Palácio.

Política Externa no Estado Novo

Dois anos depois de instalada a ditadura Vargas começa a Segunda Guerra Mundial. Apesar das afinidades do Estado Novo com o fascismo, o Brasil se mantém neutro nos três primeiros anos da guerra. Vargas aproveita-se das vantagens oferecidas pelas potências antagônicas e, sem romper relações diplomáticas com os países do Eixo – Alemanha, Itália, Japão –, consegue, por exemplo, que os Estados Unidos financiem a siderúrgica de Volta Redonda.
Rompimento com o Eixo – Com o ataque japonês à base americana de Pearl Harbour, no Havaí, em dezembro de 1941, aumentam as pressões para que o governo brasileiro rompa com o Eixo. Em fevereiro de 1942 Vargas permite que os EUA usem as bases militares de Belém, Natal, Salvador e Recife. Como retaliação, forças do Eixo atacam navios mercantes brasileiros ao longo da costa. Nos dias 18 e 19 de agosto de 1942, cinco deles – Araraquara, Baependi, Aníbal Benévolo, Itagiba e Arará – são torpedeados por submarinos alemães. Morrem 652 pessoas e Vargas declara guerra contra a Alemanha e a Itália.
Brasil na Segunda Guerra – A Força Expedicionária Brasileira (FEB) é criada em 23 de novembro de 1943. Em 6 de dezembro, a Comissão Militar Brasileira vai à Itália acertar a participação do Brasil ao lado dos aliados. O primeiro contingente de soldados segue para Nápoles em 2 de julho de 1944 e entra em combate em 18 de setembro. Os pracinhas brasileiros atuam em várias batalhas no vale do rio Pó: tomam Monte Castelo em 21 de fevereiro de 1945, vencem em Castelnuovo em 5 de março e participam da tomada de Montese em 14 de abril. Ao todo são enviados cerca de 25 mil homens à guerra. Morrem 430 pracinhas, 13 oficiais do Exército e oito da Aeronáutica.