50 anos do Golpe Militar

OS 33 DIAS DO GOLPE

13.março.64

Foto: CPDOCJB/Folhapress

COMÍCIO DAS REFORMAS

Ao lado da mulher, Maria Thereza, e de Darcy Ribeiro (chefe da Casa Civil), Jango subiu ao palanque da Central do Brasil, no Rio, após as falas do então presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), José Serra, do governador de Pernambuco, Miguel Arraes, e do deputado Leonel Brizola. No evento organizado por entidades sindicais, o presidente, que era fazendeiro, defendeu a necessidade das chamadas reformas de base (agrária, bancária, administrativa, universitária e eleitoral), paradas no Congresso. O evento, transmitido ao vivo por rádio e TV para todo o país, reuniu cerca de 200 mil pessoas.

Ouça a convocação para o Comício feito pela Rádio Nacional

QUEM APOIOU

• CGT (Comando Geral dos Trabalhadores)
• PCB (Partido Comunista Brasileiro)
• FMP (Frente de Mobilização Popular)
• UNE (União Nacional dos Estudantes
• Militares pró-Jango
• Diversos intelectuais

Reforma agrária com pagamento prévio do latifúndio improdutivo, à vista e em dinheiro, não é reforma agrária. É negócio agrário, que interessa apenas ao latifundiário, radicalmente oposto aos interesses do povo brasileiro”

- Jango, no Comício. A Constituição previa desapropriações mediante indenização prévia de dinheiro. Mas alegando falta de caixa, o governo propôs pagar com títulos da dívida pública

Veja como o Comício foi retratado, em propaganda feita pelos militares

Envolvidos

  • João Goulart

    Jango foi o 24º presidente brasileiro. Entrou no PTB a convite de Getúlio Vargas, do qual foi ministro do Trabalho. Foi vice-presidente nos governos de Juscelino Kubitscheck e Jânio Quadros, sucedendo a este último após sua renúncia. Foi deposto pelo regime militar em 1964.
  • Miguel Arraes

    Governador de Pernambuco, politicamente de esquerda, deu apoio às Ligas Camponesas e à criação de sindicatos. Para “não trair a vontade dos que o elegeram”, se recusou a renunciar, como propuseram os militares, e foi preso em 1º de abril. Libertado em 1965, exilou-se na Argélia.
  • Leonel Brizola

    Governador do Rio Grande do Sul entre 1959 e 1963, lutou com Jango pelas reformas de base. Tornou-se um dos líderes da Frente de Mobilização Popular, formada por CGT (Comando Geral dos Trabalhadores), UNE, Frente Parlamentar Nacionalista, oficiais militares, intelectuais e Miguel Arraes.
  • Darcy Ribeiro

    Ministro da Educação do governo do presidente Jânio Quadros e chefe da Casa Civil de João Goulart, foi um dos membros do governo a tentar organizar a resistência ao golpe. Na ditadura, teve os direitos políticos cassados e foi obrigado a se exilar no Uruguai.
  • José Serra

    Presidente da UNE na época, foi orador no Comício das Reformas. Às vésperas do movimento militar, a entidade emitiu um manifesto, denunciando o "golpe reacionário". Após a tomada do poder pelos militares, Serra deixou o País, em julho de 1964, exilando-se na França.
  • Dante Pellacani

    Iniciou sua militância sindical em 1948 e foi um dos principais articuladores do movimento Jan-Jan (Jânio e Jango para a Presidência). Tornou-se presidente do CGT, participando ativamente do Comício das Reformas. Foi exilado no Uruguai.
Foto: Domicio Pinheiro/Estadão Conteúdo

MARCHA DA FAMÍLIA COM DEUS PELA LIBERDADE

19.março.64

Foto: Folhapress
Como resposta ao comício da Central do Brasil e à “ameaça comunista” resultante da aproximação de Jango com a esquerda, cerca de 300 mil pessoas fizeram uma passeata no centro de São Paulo, no dia de São José. O objetivo era mostrar o descontentamento da sociedade conservadora e de setores ligados aos grandes empresários e latifundiários. Teve apoio do governador de São Paulo, Adhemar de Barros (representado pela esposa, Leonor), do governador do estado de Guanabara (Carlos Lacerda) e de Auro de Moura Andrade, presidente do Senado e do Congresso.

QUEM APOIOU

• Camde (Campanha da Mulher pela Democracia)
• União Cívica Feminina
• Fraterna Amizade Urbana e Rural
• Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo)
• Parte da Igreja

O povo veio à praça pública para demonstrar sua confiança na democracia. Veio para afirmar perante a nação que os democratas não permitirão que os comunistas sejam os donos da pátria. Democratas do Brasil, confiem, não desconfiem das gloriosas Forças Armadas de nossa pátria”

- Auro de Moura Andrade, durante a marcha (‘Folha de S. Paulo’, 20/3/1964)

Veja como a Marcha foi registrada, em propaganda feita pelos militares

Envolvidos

  • Adhemar de Barros

    O governador de São Paulo, que derrotou Jânio nas eleições de 1962, participou ativamente das conspirações do golpe conta a "comunização do País", liderando ainda a Marcha da Família com Deus pela Liberdade contra Goulart. Foi cassado em 1966, após se voltar contra o regime militar.
  • Carlos Lacerda

    O governador da Guanabara, que liderava a ala radical da UDN carioca, foi por anos defensor da intervenção militar no estado, opinião que publicava em seu jornal, “Tribuna da Imprensa”. Foi um dos líderes civis do golpe, mas depois se voltou contra a extensão do mandato de Castelo Branco.
  • Auro de Moura Andrade

    Na presidência do Senado, fez oposição a Goulart e discursou na Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em São Paulo, organizada por entidades contrárias ao governo. Em sessão do Congresso na madrugada de 2 de abril, declarou vaga a Presidência da República, embora Jango estivesse no país.
  • Dom Jaime de Barros Câmara

    O cardeal da Arquidiocese do Rio de Janeiro foi um dos organizadores da Marcha da Família com Deus pela Liberdade e pertencia ao grupo de bispos e arcebispos que se opunha ao “comunismo” e a Goulart, promovendo a “marcha da vitória” após o golpe.

REVOLTA DOS MARINHEIROS

24.março.64

Foto: Folhapress
Durante festa no Sindicato dos Metalúrgicos do Rio para comemorar os dois anos da Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais (considerada ilegal), 2 mil marinheiros e fuzileiros navais compareceram ao local liderados pelo cabo Anselmo, que fez um discurso inflamado a favor das reformas de base e da entidade, que tivera dirigentes punidos. O ministro da Marinha, Silvio Mota, mandou prender os organizadores, mas os fuzileiros enviados aderiram aos insubordinados. O episódio indicou que uma parte dos chefes militares estava descontente com Jango, que demitiu Silvio Mota logo depois.

QUEM APOIOU

• Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais (considerada ilegal)

Será subversivo manter cursos para marinheiros e fuzileiros? Será subversivo dar assistência médica e jurídica? Será subversivo visitar a Petrobras? Será subversivo convidar o Presidente da República para dialogar com o povo fardado?”

- Cabo Anselmo, durante discurso na AMFNB

Envolvidos

  • Cabo Anselmo

    Liderou a Revolta dos Marinheiros, que desencadeou o movimento contra o governo João Goulart. Depois do golpe, teria virado agente duplo, entregando parte dos companheiros de esquerda ao regime militar.
  • Almirante Cândido Aragão

    Apoiou a Revolta dos Marinheiros, a favor das reformas de base do governo Goulart, com a adesão dos fuzileiros. Após o golpe, asilou-se no Uruguai.
Foto: Arquivo/O Globo

DISCURSO NO AUTOMÓVEL CLUBE

30.março.64

Foto: Arquivo/O Globo
Em um lugar repleto de militares pró-governo, Jango defendeu novamente as reformas de base em discurso para sargentos no Automóvel Clube, no Rio. O objetivo do presidente era dar uma demonstração de força a quem o criticava pela postura assumida durante a Revolta dos Marinheiros.

A crise que se manifesta no país foi provocada pela minoria de privilegiados que vive de olhos voltados para o passado e teme enfrentar o luminoso futuro que se abrirá à democracia pela integração de milhões de patrícios nossos na vida econômica, social e política da Nação, libertando-os da penúria e da ignorância”

Discurso de Jango (‘Jornal do Brasil’, 31/3/64)

MOURÃO FILHO DÁ INÍCIO AO GOLPE

31.março.64

Foto: Arquivo/Estadão Conteúdo
Como reação ao discurso de Jango, o general Olympio Mourão Filho dá início ao golpe durante a madrugada ao encaminhar suas tropas (antes do esperado pelos próprios conspiradores) de Juiz de Fora (MG) até o Palácio das Laranjeiras, no Rio, onde estava o presidente. Pela manhã, Jango envia duas tropas do Exército do Rio até Minas e deixa o chefe do gabinete militar, Assis Brasil, de sobreaviso. Enquanto isso, Amaury Kruel (comandante do 2º Exército de SP e ligado a Jango) muda de lado: por telefone, pede para o presidente dissolver a CGT e demitir ministros de esquerda. O presidente recusa. No caminho até Minas, a tropa carioca adere aos militares golpistas.

QUEM APOIOU

• Governo de SP
• Governo de MG

Ponha-se na Presidência qualquer medíocre, louco ou semianalfabeto e, 24 horas depois, a horda de aduladores estará à sua volta, convencendo-o de que é um gênio político e um grande homem [...] Em pouco tempo, transforma-se um ignorante em um sábio, um primário em um estadista"

- Olympio Mourão Filho, no livro ‘Memórias: a verdade de um revolucionário’ (1978)

Envolvidos

  • Olympio Mourão Filho

    Deu início ao movimento de tropas que afastou Goulart da Presidência com a “Operação Popeye”, em referência ao seu cachimbo, saindo de Juiz de Fora rumo ao Rio de Janeiro para barrar as forças legalistas. Depois se afastou do regime, fazendo críticas a Castelo Branco.
  • General Assis Brasil

    Chefe da Casa Militar, acompanhou Goulart ao exílio e foi preso no Forte de Jurujuba (RJ). Tinha controle sobre o chamado “dispositivo militar”, nome dado ao suposto esquema montado por militares ligados a Jango e colocados no alto comando para defendê-lo em caso de golpe.
  • Amaury Kruel

    Comandante do 2ª Exército, em São Paulo, foi ministro de Guerra de Jango. Mobilizou suas tropas para apoiar o golpe, mas, antes, teria proposto a Goulart a extinção do CGT e demitisse ministros de esquerda, com o que o presidente não concordou.
  • José de Magalhães Pinto

    Eleito governador de MG em uma coligação liderada pela UDN, envolveu-se nas articulações para a derrubada de Goulart, tendo se encontrado com militares mineiros. Também participou das negociações para a escolha de Castelo Branco. Foi um dos subescritores do AI-5.
Foto: Arquivo/Estadão Conteúdo

O GOLPE AVANÇA

1º.abril.1964

Foto: Arquivo/Estadão Conteúdo
O Forte de Copacabana é tomado pelos militares golpistas que defendem o Palácio da Guanabara (casa do governador oposicionista Carlos Lacerda). No Recife, o governador Miguel Arraes é preso e, no Rio, a sede da UNE é incendiada. Jango é aconselhado a ir para Porto Alegre, onde é recebido por Brizola. Enquanto isso, os EUA, por meio do embaixador Lincoln Gordon, preparam a Operação Brother Sam: caso o golpe não vingasse, o Brasil seria invadido por uma poderosa frota da marinha americana vinda do Caribe em direção ao Rio.

Deputado Rubens Paiva faz apelo em defesa de Jango na Rádio Nacional

QUEM APOIOU

• EUA

A invasão ao Forte de Copacabana, em propaganda feita pelos militares

Envolvidos

  • Lincoln Gordon

    O embaixador dos Estados Unidos no Brasil no governo John Kennedy pediu apoio logístico caso o golpe não se efetivasse, acionando a Operação Brother Sam. Com o golpe, apressou-se para obter do presidente Lyndon Johnson o reconhecimento do novo regime antes mesmo de Goulart dirigir-se ao exílio no Uruguai.

PRESIDÊNCIA É DECLARADA VAGA

2.abril.1964

Foto: Arquivo/Estadão Conteúdo
O presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, convoca durante a madrugada uma sessão extraordinária no Congresso para oficializar o golpe. Ele ignora a informação passada por Darcy Ribeiro de que Jango está no Brasil e declara vaga a presidência da República. Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados, vira presidente interino, e o general Costa e Silva envia um comunicado aos militares se autonomeando comandante-em-Chefe do Exército.

Ouça o áudio da sessão

O senhor presidente da República deixou a sede do governo, deixou a nação acéfala numa hora gravíssima da vida brasileira em que é mister que o chefe de Estado permaneça à frente do seu governo [...] Esta acefalia configura a necessidade do Congresso Nacional, como poder civil, imediatamente tomar a atitude que lhe cabe”

- Auro de Moura Andrade

Envolvidos

  • Ranieri Mazzilli

    Presidente da Câmara dos Deputados, assumiu a Presidência interina na ausência de Jango do País, após a renúncia de Jânio Quadros, quando foi aprovada a emenda do parlamentarismo. Também assumiu após o golpe, facilitando a fundamentação política e constitucional do golpe.
  • General Costa e Silva

    Liderava a linha dura das Forças Armadas e participou ativamente do golpe contra Goulart, assumindo o Ministério da Guerra após sua queda. Em 1966, foi eleito presidente pelo Congresso pela Arena. O AI-5 foi baixado durante seu governo.
Foto: Domício Pinheiro/Estadão Conteúdo

JANGO PARTE PARA O EXÍLIO

4.abril.1964

Foto: CPDOC/GV
Ao lado da família e do chefe do gabinete militar Assis Brasil, João Goulart se esconde em São Borja (RS). No dia 4, partem para o Uruguai. Anos depois, Jango se mudaria para a Argentina, onde morreria em 1976, de ataque cardíaco. Em novembro de 2013, seu corpo foi exumado pela Comissão da Verdade para se determinar se sua morte foi ocasionada por envenenamento. Seus restos mortais, dessa vez, foram enterrados com honras de chefe de Estado.

O mais difícil foi para o Jango, que não podia voltar. Eu voltei para o casamento do meu irmão, da Ieda Maria Vargas, voltei para ver meu pai, que estava doente. Mas é claro que passei por vários constrangimentos. Fui presa. Até no casamento do meu irmão fiquei num canto sozinha”

- Maria Thereza Cruz, viúva de Jango, ao ‘Zero Hora’ em 2013

BAIXADO O AI-1

9.abril.1964

Foto: Arquivo/O Globo
Costa e Silva edita o Ato Institucional nº 1 (AI-1). Ele permite a cassação de mandatos e a suspensão de direitos políticos. Também são marcadas eleições indiretas em dois dias para Presidência e vice-presidência da República.

O Ato Institucional que é hoje editado pelos Comandantes-em-Chefe do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, em nome da revolução que se tornou vitoriosa com o apoio da nação na sua quase totalidade, se destina a assegurar ao novo governo a ser instituído, os meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil”

- Trecho do A-1

CASTELO BRANCO ASSUME A PRESIDÊNCIA

15.abril.1964

Foto: Arquivo/O Globo
Em um Congresso Nacional com diversas baixas devido a cassações e prisões, Costa e Silva anuncia o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco como o novo presidente. Com mandato definido até dezembro de 1966, o general criou em seu governo o SNI (Serviço Nacional de Informações) e outros três Atos Institucionais. Os militares só deixariam o poder em 1985 e o Brasil só teria uma outra eleição direta em 1989.

Farei quanto em minhas mãos estiver para que se consolidem os ideais do movimento cívico da nação brasileira nestes dias memoráveis de abril, quando se levantou unida, esplêndida de coragem e decisão, para restaurar a democracia e libertá-la de quantas fraudes e distorções a tornavam irreconhecível. Não através de um golpe de Estado, mas por uma Revolução”

- General Castelo Branco

Veja a posse de Castelo Branco

Envolvidos

  • Castelo Branco

    Na Escola Superior de Guerra, exerceu influência nas ideias que culminaram com o golpe de 64 e se encarregou da parte política do golpe. Acabou sendo o nome de consenso para ocupar o lugar de primeiro presidente pós-golpe.
  • General Golbery do Couto e Silva

    Braço direito do presidente Castelo Branco, pregava o alinhamento do Brasil com as potências ocidentais. Assumiu a direção do Ipes (Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais), tendo papel de destaque no movimento golpista. Foi um dos professores da Escola Superior de Guerra e estudioso da geopolítica.
  • Ernesto Geisel

    Integrava o grupo militar conhecido como "Sorbonne", ligado à Escola Superior de Guerra. Após o golpe, foi nomeado chefe da Casa Militar, e eleito presidente em 1972, articulando a abertura política.
Foto: Domício Pinheiro/Estadão Conteúdo